DIALOGICIDADE NA MISSÃO
Para falar da
dialogicidade na missão, é necessário considerar alguns aspectos do processo
missionário. O primeiro é o diálogo conosco mesmo e com Deus, ambos são
inseparáveis. Um segundo, entrelaçado com o primeiro, é o diálogo com a
cultura, as pessoas que a vivem e suas consequências. Um terceiro seria o
aspecto do diálogo inter-religioso. E consequentemente alguns escritos de Pallotti e de Papa Francisco sobre a Caridade no
processo da dialogicidade como tal.
Toda missão nasce
da paixão por Jesus que se traduz no desejo de servi-lo servindo os outros. A
Missão é antes de tudo, estarmos onde Deus nos quer e fazer o que Ele nos pede.
Nesse sentido podemos dizer que a Missão é um longo caminho para dentro do
coração de Deus que toma completamente conta de nossa vida, e nos conduz por
novos caminhos.
Missão é partir,
caminhar, deixar tudo, sair de si, abrir-se para deixar-se conduzir, deixar que
o Coração de Deus nos leve a um serviço maior. Isso exige, do missionário, maturidade,
constante diálogo consigo mesmo, para entrar no processo. Necessita uma intensa
busca de si numa nova realidade para descobrir o novo de Deus e crescer na vida
espiritual.
O verdadeiro
missionário caminha com o Senhor, fala com Ele, trabalha com Ele. Percebe o
Deus vivo independente da própria ação.
Ser missionário é
deixar “que a vida de Nosso Senhor Jesus Cristo seja a minha vida”. É abrir-se
sem temor a ação do Espírito e anunciar com a vida que foi transfigurado na
presença de Deus vivo e ressuscitado. O ser humano é essencialmente “enviado”,
ou seja, alguém que recebeu uma missão. A transformação em Jesus Cristo conduz
necessariamente a participação na sua missão redentora.
Um segundo aspecto
de fundamental importância é saber, que o missionário é um hóspede, estrangeiro
que estabelece sua morada na casa do outro. Isso exige a capacidade de dar e
receber constantemente. Desloca-se como um peregrino e vive permanentemente
como estranho, testemunhando a provisoriedade e a contínua busca de uma morada
definitiva. É convidado a levar somente uma túnica, isto é, estar revestido de
Cristo. É alguém que busca um tesouro escondido no seio dos povos e das
culturas, ao mesmo tempo leva o tesouro da compaixão de Deus, num processo de
inter-ajuda e de procura do Absoluto.
Ser hóspede
significa viver situação de dependência, sua casa é a casa do outro, é uma casa
sagrada, um chão sagrado, no qual se faz necessário “tirar as sandálias” para
situar-se na nova cultura. E nessa situação, são estabelecidos novos
relacionamentos e ocupados os espaços permitidos.
A missão sempre nos
move, desestrutura, desinstala e impulsiona a ir além de onde estamos e do que
somos. Permite superar a rotina que leva a fechar-se na própria identidade e
impede a reconhecer o dom da alteridade. A fé na Trindade e a vivência da
missão como atitude fundamental manifesta a alegria de saber-se em comunhão com
Deus e com os demais, nos permite celebrar a festa do amor com os outros,
especialmente com os mais pobres e excluídos. (cf. Paleari, Giorgio, Espiritualidade e Missão, pg. 61-62. Paulinas,
2005).
A primeira atitude
que acompanha o missionário é a do silêncio e da escuta diante do mistério,
porque aquela terra é sagrada. É terra da revelação de Deus que ao mesmo tempo
gera ansiedade e alegria pelo novo. Se busca conhecer as pessoas, seus
costumes, suas histórias e suas dificuldades. É uma escuta que vai além das
palavras. É o lugar da revelação de sua identidade.
O diálogo e o
contato com as pessoas, aprofunda a possibilidade de mergulhar no mais íntimo
do seu próprio ser, de descobrir as raízes, de viver a profunda experiência de
Deus. O missionário é sempre um discípulo em busca do tesouro e do rosto de
Deus.
O missionário é
aquele que está sempre aprendendo com o Outro e com os outros e ao mesmo tempo
é o mestre que partilha o presente que recebeu de Deus. Ensina e aprende ao
mesmo tempo. Aconselha e recebe conselhos. Partilha o que sabe e partilha do
saber do outro. Reconhece que cada pessoa é digna de sua entrega (cf. EG. 274)
Aprender uns com os
outros, trata-se de recolher os dons que o Espírito nos deu através deles. O
diálogo implica dar e receber, falar e escutar, ensinar e aprender. É a palavra
sendo gestada, a palavra que se faz carne na morada da vida de cada um.
Partilha aquilo que transborda do coração, da experiência de Deus. Descobre a
semente do Verbo, “recolhe a misteriosa sabedoria que Deus quer comunicar
através deles” (EG. 198).
O diálogo com a
cultura implica escutar os clamores, prestar atenção nas fragilidades, reconhecer
o Cristo sofredor e cuidar da dignidade da pessoa. É carregar sobre si os
sofrimentos, as ansiedades e as limitações humanas. É ser solidário com os
pobres e excluídos e ao mesmo tempo comprometer-se com sua causa, sendo uma voz
profética onde é necessário.
O missionário é
alguém profundamente comprometido contra as injustiças e contribui na
elaboração de projetos de resgate da vida. Vive a utopia do Reino na
proximidade e solidariedade, numa compaixão pessoal e silenciosa, na esperança
que o mundo se transforme e se torne mais fraterno, sempre apontando para um
reino de justiça e de fraternidade para todos.
Como Pallotti se
pode dizer que: “Todos somos chamados a
observar o preceito da caridade e, porque todos, segundo a realidade da
criação, uma imagem da caridade por essência. Eis porque Deus ordenou que cada
um se interesse também pelo seu próximo, como dele se interessa o próprio Deus.
(OOCC IV, 132, 310, 451)
Antes de ser uma
atividade, o diálogo é um encontro e uma exigência cristã. Está enraizado
profundamente no mistério trinitário, num Deus que é amor e comunhão. Como
dizia Santo Agostinho: Sua missão se origina no amor, se sustenta por amor e
comunica amor, criando assim comunhão.
O amor de Deus se
torna amor do próximo “Caristas Christi urget nos” – é a alma do seu
apostolado. O amor deve ser vivido de tal modo que realize o mandato de Cristo,
quando nos convida a amar-nos uns aos outros como Ele nos amou (cf. OOCC I,8).
O
missionário além dialogar consigo mesmo, com Deus e com a cultura em seu
caminhar como estrangeiro e peregrino, entra em contato com povos de outras
crenças, isso exige dele uma clara identidade religiosa, e também uma firme
convicção de que Deus quer a salvação de todos (cf. ITm 2,4); que sua graça vai
além dos limites visíveis da Igreja; bem como a de que Jesus Cristo é o único
Salvador de toda a humanidade, sendo a Igreja o lugar em que se encontram em
plenitude os meios de salvação. O diálogo está sempre associado ao anúncio;
ambos são inter-conexos, pois, sempre se deseja conhecer claramente quem se
está encontrando.
O
missionário é uma pessoa de compaixão, solidária, capaz de olhar o diferente
não como ameaça, mas com respeito. A salvação é sempre um grande dom de Deus,
oferecida a todos, segundo os critérios e métodos do próprio Senhor. Portanto,
abertura a outras religiões, bem como o respeito que deve acompanhar a
aproximação, exige uma disposição constante à ação do Espírito Santo (cf. Rm
8,29)
O diálogo na
experiência religiosa acontece, quando pessoas de diferentes crenças comunicam
o próprio caminho para Deus. Quando se busca a paz num esforço conjunto de
construir unidade e de superar conflitos. Também o diálogo de intercâmbios
teológicos, na qual adeptos de várias religiões refletem e comparam os dados da
própria fé. Na experiência de escuta e de comunicação com o outro, se pode
dizer que o missionário se transforma, pois daí surge o desejo profundo de
busca de unidade em Deus e de respeito profundo pela diversidade.
O diálogo
inter-religioso, se sustenta e se anima numa espiritualidade baseada numa fé
viva num Deus que é criador e Pai de toda a humanidade; numa convicta e aberta
esperança que não busca os resultados imediatos e,numa caridade efetiva e
dialógica como dom gratuito de Deus.
O missionário vive
na fronteira e cruza todas as fronteiras, sua espiritualidade enraíza-se na
universalidade, encontra seu melhor chão na abertura além-fronteiras. O
objetivo principal da ação missionária é chegar à comunhão das pessoas com Deus
e com elas mesmas.
O dinamismo da
comunhão de vida, leva à caridade, à solidariedade, ao encontro e escuta do
outro, à cooperação missionária, ao diálogo ecumênico, inter-religioso e
social, a trabalhar naquilo que nos une, promovendo assim a reconciliação e a
comunhão universal. “Unidade no necessário, liberdade na dúvida, caridade em
tudo” (GS, 92).
A Comunhão é um dos
objetivos mais importantes da missão; e ao mesmo tempo um dos meios de
testemunho mais eficaz para a evangelização: “Como tu Pai, estás em mim e eu em
ti, que eles também sejam um em nós, para que o mundo creia que tu me
enviaste(Jo 17,21). Uma Igreja em comunhão (Koinonía) se torna um sinal e
instrumento da União com Deus e da unidade de todo o gênero humano. (cf. GS 92)
“O compromisso não consiste
exclusivamente em atuar, o que o Espírito mobiliza, impulsiona não é um
ativismo, mas antes de tudo uma atenção colocada no outro, considerando-o como
um consigo. Esta atenção amante é o início de uma verdadeira preocupação por
sua pessoa, a partir da qual deseja buscar efetivamente seu bem. Isso implica
valorizar a pessoa no que ela tem de próprio, com sua forma de ser, sua
cultura, seu modo de viver a fé. O verdadeiro amor sempre é contemplativo, nos
permite servir ao outro, não por necessidade, ou por vaidade, senão porque ele é
belo, mais além de sua aparência” (EG 199).
O amor pelos irmãos, é
autentico se nos compromete a fazer com que Jesus seja amado “conhecido” (cf.
OOCC I).
A missão além
fronteiras sempre foi uma preocupação de São Vicente Pallotti, poderíamos dizer
que foi o princípio da UAC, sua razão de existir e seu fim.
- O que eu faço
individual e comunitariamente para ajudar a atividade missionária “ad
gentes”?
- Estamos numa
cultura de constante mudança. O que faço para promover o diálogo na
realidade atual, com tantos desafios dos meios de comunicação que levam a
uma indiferença cultural, religiosa, social e individualista?
- O que como UAC
podemos colaborar para a paz, num mundo que promove a constante violência?
Irma Maria Neide Sibin, CSAC
Bolívia
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