sexta-feira, 12 de março de 2010

SER MISERICORDIOSO COMO O PAI

Nosso Senhor, certa vez, disse que suas Palavras são “espírito e vida”. A mesma Palavra da Sagrada Escritura pode nos tocar de um modo em determinada fase de nossas vidas e depois vir a tocar-nos de outro. Assim acontece com a passagem que a liturgia nos traz neste quarto Domingo da Quaresma. É a parábola do filho pródigo, mas que poderia também chamar-se parábola do Pai Misericordioso. Nela estão três personagens: O filho mais novo, o filho mais velho e o pai. A maioria de nós talvez já se tenha identificado com os três.Quantos hoje em dia se identificam com o filho mais novo: “‘Pai, dá-me a parte dos bens que me corresponde.’ E o pai repartiu os bens entre os dois. Poucos dias depois, o filho mais novo, juntando tudo, partiu para uma terra longínqua e por lá esbanjou tudo quanto possuía, numa vida desregrada.” (Lc 15, 12-13) Este mundo, a natureza, o nosso corpo, a saúde, os nossos dons pessoais, são a herança que recebemos de Deus. Muitos decidem usar desta herança longe do Pai do Céu. Repetem o pedido do filho mais novo: “‘Pai, dá-me a parte dos bens que me corresponde.” Quantos jovens se identificam literalmente com este filho mais novo, enganados pelas coisas do mundo e pela sexualidade errada na juventude, deixam seus estudos, sua família… e se não deixam a família paterna acabam por deixar a “sua” família; a família que Deus tinha sonhado dar-lhes, de forma bem estruturada e sadia, mas que ele, pelos desvarios da juventude acabam por danificá-la ou até destruí-la nos seus inícios ou até antes mesmo que ela aconteça. É uma lástima ver quantas vocações são destruídas pelo mesmo que levou o filho pródigo à miséria: “… por lá esbanjou tudo quanto possuía, numa vida desregrada.” Ou como vem mais literalmente no versículo 30 : “com as meretrizes”. A consequência não tarda: a solidão, o descontentamento e quando não a miséria mesmo material.

Nos identificamos também com o filho mais velho tantas vezes que não fomos capazes de um perdão generoso. Tantas vezes que não experimentamos que tudo que é do Pai é também nosso. Que nos sentimos mais escravos do que filhos. O único que pode nos libertar desta religião carrancuda e legalista é o Espírito Santo. De facto São Paulo nos diz: “Vós não recebestes um Espírito que vos escravize e volte a encher-vos de medo; mas recebestes um Espírito que faz de vós filhos adoptivos. É por Ele que clamamos: Abbá, ó Pai! Esse mesmo Espírito dá testemunho ao nosso espírito de que somos filhos de Deus. Ora, se somos filhos de Deus, somos também herdeiros: herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo, pressupondo que com Ele sofremos, para também com Ele sermos glorificados.” (Rm 8,15-17) Porém não queremos nos deter nos filhos, pois a meta de nossa vida é identificar-nos com o Pai.

O Pai da parábola tem três características que são desdobramentos do seu Amor e da Sua Misericórdia. Ele é sofredor, cheio de perdão e é generoso.* A primeira característica: é sofredor. O amor do pai não é indiferente à miséria do filho longe de casa. Prova disso é a prontidão em ver o filho enquanto ainda estava longe. Quantas tardes ele não deve ter olhado ao horizonte naquele caminho pelo qual o filho mais novo tinha se afastado de casa para ver se ele voltava. Só encontrava saudade em seu lugar. Porém numa tarde foi diferente. Quando olhou ao longe, percebeu quem estava a voltar. Não esperou que ele chegasse em casa: “Quando ainda estava longe, o pai viu-o e, enchendo-se de compaixão, correu a lançar-se-lhe ao pescoço e cobriu-o de beijos.” (Lc 15,20) Essa prontidão mostra quanto ele sofreu nesta ausência. Jesus disse: “Quem me vê, vê o Pai.” Sobre Jesus Crucificado nos diz São Paulo na segunda leitura: “Aquele que não havia conhecido o pecado, Deus o fez pecado por nós, para que nos tornássemos, nele, justiça de Deus.” (2 Cor 5,21) Sobre o perdão vemos claramente no gesto do abraço. Quanto à generosidade, esta vem expressa tanto no repartir os bens entre os filhos no início parábola, quanto na “Melhor veste”, no “anel no dedo”, “no vitelo cevado”, enfim na festa.

Estamos nesta mesa de peregrinos que é a Eucaristia, em que nos é dado, como ao Povo de Israel o maná. Com Ele caminhamos para a nossa verdadeira casa. Nossa casa é o Céu. Lá esperamos “comer dos frutos da terra prometida” e este abraço eterno que o Senhor nos dará: “‘Vinde, benditos de meu Pai! Recebei em herança o Reino que vos está preparado desde a criação do mundo. Porque tive fome e destes-me de comer, tive sede e destes-me de beber, era peregrino e recolhestes-me, estava nu e destes-me que vestir,…” (Mt 25,34-36) Em outras palavras: Aprendestes a ser Misericordiosos com o Vosso Pai do Céu.

Para Partilhar:
1- Cada um de nós já foi ou é um “filho pródigo”, uns mais outros menos. O Pai ao contrário, é sofredor pela ausência do filho, pródigo no perdão e abundante na generosidade. Como podemos ser mais semelhantes ao Pai nestas três características?
*(Cf. Lectio Divina para cada dia del año, Ed. Verbo Divino, p.265)
Pe. Marcelo

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