De 5 a 8 de dezembro de 1995, teve lugar em Nairobi/Quênia, a Assembléia dos Superiores Maiores Palotinos da África. Naquela oportunidade, D. Henryk Hoser, abp palotino polonês, que é médico e foi Superior Regional de Ruanda e Superior da Região da Divina Misericórdia, na França, fez uma conferência sobre a União do Apostolado Católico. Cremos que é muito importante e por isso a publicamos, agora, traduzida do texto original francês.
A sinfonia “inacabada” de São Vicente Pallotti
Esta breve apresentação da herança do nosso Fundador, longe de ser exaustiva, limita-se a um olhar retrospectivo, necessário para compreender a aposta da nossa situação e propor um esforço a ser feito por nós, em toda fidelidade à nossa vocação e missão palotina.
1.0. União do Apostolado Católico durante a vida de Pallotti
1.1. Conseqüência da visão de Regina Coeli, 1835-1839
Vários momentos marcam de modo significativo este período. A formação e a manifestação pública do primeiro círculo apostólico, misto e quase espontâneo, a obtenção da licença do Vicariato de Roma, a adoção do nome, que o Papa utilizou no seu decreto: “Sociedade do Apostolado Católico”; o primeiro estatuto da “Pia União chamada Apostolado Católico”, a entrega à “Sociedade” do convento Fuccioli, como sede do orfanato confiado à solicitude de Salvati; tudo isso significa um bom início. O objetivo ampliado (missão ad gentes e apostolado dos fiéis), a criação de três grupos ou classes de membros em 1836, a primeira celebração pela Sociedade da festa da Epifania, o esboço da “pars centralis et motrix” com sua instalação junto à igreja do Espírito Santo, tudo deve ser colocado ao lado dos benefícios.
Aparecem, contudo, os primeiros fracassos. A proibição de imprimir formulários de adesão dos membros, o conflito com a União de Lyon, que acarreta o abandono do projeto do Colégio Missionário e levou o Papa a querer dissolver a Sociedade, decisão que felizmente não foi executada, e, por fim, a perda da terceira classe de membros em proveito da União de Lyon, tudo isto traça a perspectiva que não abandonará jamais a Obra de Pallotti, perspectiva de dificuldades e até de impossibilidade de sua realização.
1.2. Inspiração de Camaldoli, 1839-1846
Este período, que dá origem a um projeto grandioso, confirma a crescente dicotomia entre a idéia e sua realização. Nem a Igreja e nem a mentalidade reinante da época estavam dispostas a aceitar uma mobilização geral das forças vivas dos fiéis em vista de um renascimento da evangelização, iniciativa baseada de fato sobre a consciência do século futuro. A atenção de Pallotti concentra-se sempre mais na “parte central” da Obra.
1.3. Face à realidade 1846- 1850
Mas os fracassos não faltaram, sobretudo na Inglaterra para onde fora enviado R. Melia em 1842. Nem a casa dos convertidos, nem a casa de Oxford, nem aquela de Kentishtown viram a luz do dia. A iniciativa de P. de Geslin na França não teve seguimento. Na Itália a revolução de 1848 e perturbações de todo gênero aniquilaram as aquisições sociais da União de outrora. A pastoral e as atividades de caridade dos membros da Sociedade (Congregação) açambarcaram todas suas forças ao ponto de até a estrutura interna da “parte central” não ter sido completada. À morte inopinada de Pallotti, em 22 de janeiro de 1850, a Obra de Pallotti permanecia sempre in statu nascendi, isto é, em via de nascimento.
2.1. Pia Societas Missionum, 1854-1910
O momento de expansão veio com o mandato de Faà di Bruno (1869-1889) como Superior. Graças a sua generosidade chegou a alcançar o número de 80 membros, repartidos em treze comunidades. O Colégio de Másio tornou-se o viveiro de missionários que contribuíram pessoalmente para a expansão da Sociedade no mundo. Ela veio a encontrar-ser na América do Norte (1884), na América do Sul (1886-1888), na África (1892) e na Austrália (1901). Em 1904 a PSM obteve o estatuto de instituto de direito pontifício. Cinco anos mais tarde, o rápido crescimento tornou possível a criação das quatro primeiras províncias.
A aprovação pela Santa Sé das Constituições da Sociedade, em 1º de março de 1910 (no 75º aniversário da Obra de Pallotti) confirma de uma parte sua maturidade relativa, mas doutra parte reflete a consciência palotina em si e por relação à União do Apostolado Católico. Esta denominação nem sequer existe à época. A promoção da União não entra no quadro de tarefas específicas da PSM. Só acidentalmente “ os Superiores e os membros todos desenvolvam um cuidado solícito em procurar auxiliares ou cooperadores externos, que, com o trabalho gratuito, a oração e contribuições pecuniárias, concorram, segundo suas posses, para o fim do apostolado católico e a difusão da prática de vida cristã”.
2.2. Fase latente da União 1910-1963
A expansão missionária e o deslocamento do centro de gravidade da Sociedade para Limburgo, conjugados com o aparecimento do ramo das Irmãs Missionárias frutificaram logo na fundação e na difusão da Obra de Schönstatt. Durante muito tempo considerada como a realização fiel do carisma de São Vicente, esta obra saiu da família palotina e achou-se fora dela a partir de 1965. Sua saída, embora dolorosa, prova, mais que nada, que durante anos ela constituía uma solução de substituição à União do Apostolado Católico, que no seu espírito não suporta exclusivismo.
Dois grandes eventos marcaram este período. A restituição do nome autêntico da Obra - Apostolado Católico (1947) e seu reconhecimento universal pela beatificação (1950) e canonização (1963) de seu Fundador. Esta última coincidiu com o Concílio Vaticano II, a mais solene consagração da visão profética de São Vicente Pallotti.
3.0. De volta às fontes 1963-1995
Quanto à Sociedade, ela não tem mais dúvida: ”Ela é parte integrante da União do Apostolado Católico” e também: ”A nossa Sociedade é a comunidade central da União do Apostolado Católico. Como tal, tem uma responsabilidade especial pela eficiência apostólica e pela espiritualidade de toda a União”.
O Ano Jubilar 1985, 150 anos de existência da União, marcou o ponto de partida de uma série de iniciativas comuns em favor da promoção do que constitui o essencial da mensagem de Pallotti que através da sua obra “chama a todos, convida a todos, desperta o zelo e a caridade de todos os fiéis de cada estado, grau e condição, para que todos humilde, amorosa e generosamente respeitem e venerem o Apostolado Católico como foi instituído por Jesus Cristo na sua Igreja”.
4.0. Conclusão a respeito do passado
A enorme e profética visão do Apostolado Católico, de inspiração divina que habitava São Vicente Pallotti e destinada a ajudar a Igreja” no cumprimento de sua missão”, não pôde realizar-se durante a sua vida. Múltiplas razões e obstáculos de ordem histórica, teológica e canônica, próprios da Igreja da época, opuseram-se-lhe eficazmente. No final da sua vida o Fundador consagrou-se à organização de comunidades de homens e de mulheres, às quais legou sua herança e sua missão espiritual de fazer viver uma Obra de maior envergadura. Para Pallotti, a União, no sentido atual desta palavra, é uma instância superior, que engloba “congregações” de padres, irmãos e irmãs. Eles, como uma “parte central e motora”, alma e promotora, devem levar para o futuro a idéia e sua realização.
Contudo, deixadas em estado embrionário, as duas comunidades lutaram por sua própria sobrevivência, aproximando-se mais e mais das estruturas “clássicas” de congregações religiosas. Já Vaccari considerou a União (“Sociedade” em Pallotti) como uma ordem terceira, do tipo dominicano ou franciscano. Este condicionamento levou a uma evolução centrada sobre si mesma e individualista, separada de toda outra comunidade fundada pelo Santo. O fim primeiro e fundamental foi perdido, ao passo que os objetivos próprios de cada um e muito discordantes eram admitidos. Formas residuais da União são difíceis de serem avaliadas quanto à sua qualidade ou quantidade.
Foi necessário que viesse o Pentecostes do Concílio Vaticano II para que a “parte central e motriz” despertasse. Iniciativas mais e mais consistentes preparam o terreno da nova evangelização na perspectiva do Terceiro Milênio do cristianismo.
5.1. Uma das primeiras é a inércia. Palotinos e Palotinas, ao viverem durante um século na perspectiva da própria auto-suficiência, desenvolveram não somente um estilo de vida, às vezes próximo ao de um convento e muitas vezes clerical, mas também formas mais ou menos tradicionais de apostolado às quais permanecem ligados. Este estilo e esta maneira de viver são comunicados de uma geração a outra. Doutra parte, a penúria de vocações em certos países não se presta mais facilmente para operar mudanças em profundidade, para por em questão um comportamento falsamente seguro.
5.2. Uma outra causa pode estar na má percepção da universalidade dos meios. Não tendo fim e objetivos bem estruturados, os filhos e as filhas de Vicente Pallotti tiveram sempre a tendência a ocupar-se de tudo, sem muito discernimento. As antigas Constituições são disso a melhor ilustração:
5.4. A encarnação da União do Apostolado Católico, confiada à discrição das comunidades locais da Sociedade ou das Congregações de Irmãs, permanece no estádio de iniciativas espontâneas e fora de um quadro preciso. Entre estas iniciativas e “microrealizações” e as instâncias supremas existe um vazio estrutural que deveria ser preenchido a fim de evitar um fracionamento da União em pequenos círculos efêmeros.
5.5. Ademais, os discípulos de Pallotti não recebem no decurso de sua formação inicial e permanente uma preparação específica e competente para se tornarem animadores, “fundadores” da União, abertos à graça da cooperação, sobretudo com os leigos. E, se esta preparação existe, ela é unilateralmente teológica e teórica.
5.6. Finalmente, se coloca uma questão: Perceberam os Palotinos que a realização da União não é facultativa, mas obrigatória? Se não for assim, para que servem as afirmações seguintes de nossa Lei:
6.0. UAC - instrumento da nova evangelização
6.1. O aprofundar a fé e reavivar a caridade, tão caro a Pallotti, é sublinhado como o desafio principal: “Hoje, na África, ‘a formação da fé.. muitas vezes permaneceu no estádio elementar... O aprofundamento da fé é urgente no sentido de que a evolução rápida da sociedade faz surgir desafios novos”. Ou então: ”A evangelização se faz antes de tudo através do testemunho da caridade, o testemunho da santidade”.
6.2. O universalismo e complementaridade de vocações, tão sublinhados por Pallotti, são também onipresentes. “Toda a comunidade tem necessidade de ser preparada, motivada e reforçada pela evangelização, cada um segundo seu papel específico no seio da Igreja”. E ainda: “ O anúncio do Evangelho não pode realizar-se plenamente sem a contribuição de todos os fiéis, em todos os níveis da Igreja universal e local”.
6.3. Viver como cristão e sobretudo agir juntos torna-se um imperativo:
“Numerosos membros da Igreja na África - clero, religiosos, religiosas, leigos - integraram-se de maneira perfeita no processo sinodal, “caminhando juntos”, colocando seus talentos a serviço da Igreja”. E a exortação desenvolve a visão da solidariedade pastoral orgânica”.
No plano prático “é proibido fazer o que nos dá na cabeça”. Devemos constatar que se impõem certas linhas de orientação.
Dom Henryk Hoser SAC
Tradução do
Pe. João Baptista Quaini SAC
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