Já são alguns anos que temos experimentado um verdadeiro “boom” sobre os anjos. Eles estão representados em todas as partes: em imagens, em quadros, em livros e até no cinema. Vêem apresentados com traços doces, comoventes, afetuosos. Mas geralmente são representações muito distantes das aparições fortes e poderosas dos anjos na Sagrada Escritura. No entanto, é justamente nesta hora atual que muita gente fiel a Deus ou não, os encontra muito acessíveis. E, mesmo sendo representações não muito fiéis à fé original, ou seja, porque são representações mais prazerosas ao sentimento é que se tornaram atrativas. Esta moda, enfim, suscitou uma verdadeira sensibilidade angélica, depois de anos de ceticismo, os quais o sobrenatural foi questionado, e durante os quais até mesmo entre teólogos não se encontrava clareza sobre esta doutrina.
Para Vicente Pallotti, não se trata de colocar em discussão a existência ou não dos seres angélicos, até porque o fascínio moderno sobre eles, assim como experimentamos hoje, não existia em seu tempo. Suas meditações sobre os anjos, de fato, refletem o Credo. São, antes de tudo, voltadas a Deus Criador, Criador do céu e da terra, e de todas as coisas visíveis e invisíveis. E, em cada meditação, é este o seu ponto de partida: ‘aquelas verdades da fé que se encontram na Bíblia e nos ensinamentos dos Padres’. Assim, é claro a Vicente que, entre as coisas invisíveis criadas por Deus estão os anjos e que entre eles existe uma hierarquia e classificação.
A partir daí, desta premissa, São Vicente nos convida a rezar. E o nosso ‘compromisso’ então, não é fazer uma reflexão teológica ou discutir uma tese, mas tratar sobre a fé, perguntando-nos: em nosso ato de fé, em meu próprio vivenciar a fé, qual lugar ocupa a Sagrada Tradição, transmitida a partir da Sagrada Escritura e os Santos Padres?
Vicente Pallotti quer reascender o nosso sentimento religioso e reavivar a nossa fé. Então, em nosso pensamento, em nosso comportamento e em nossa mente devemos nos abrir às suas palavras: “Deus está sempre ocupado em comunicar aos homens seus dons, suas graças, suas misericórdias, ou imediatamente de Si ou através de seus Anjos custódios...”
Então agora podemos nos perguntar: consigo pensar assim? Consigo aceitar e acreditar que Deus se interessa e é tão atento, capaz de se ocupar de nós, de mim, de cada pessoa? E ainda, consigo pensar que é assim mesmo que Ele age em minha vida, em minha existência cotidiana?
Sempre São Vicente Pallotti se apresenta a nós com um convite a viver a fé, isto é, a crer e a acolher a certeza de que Deus quis nos chamar à existência justamente porque nos ama. Ele, ainda mais, nos convida a acreditar que este mesmo Deus criou todas as coisas - inimagináveis! - para colocá-las a serviço meu e de minha vida: “Assim, Tu estimas assim tanto a nossa alma, que colocas sabiamente toda a sua obra, e o ministério de tantos anjos para nos prover, nos ajudar em nossas necessidades da alma e do corpo. E assim, não sejamos de forma alguma impedidos de alcançar o nosso único e último beatíssimo fim, é Todo Vós mesmo!...”
Vivo eu com a consciência de que Deus, infinitamente grande, criou todas as coisas visíveis e invisíveis para que me ajudem a viver bem e corretamente? Vivo com a certeza de que Deus se doa em sua Criação para servi-me e não para se tornar um obstáculo para mim?
Assim, chegamos ao segundo ponto importante nesta meditação de Vicente Pallotti, ou seja, tudo Deus nos deu para que possamos “conseguir o nosso único e último beatíssimo fim, que é Todo Vós mesmo em Sua manifestação de glória imensa, infinita, eterna, incompreensível!”
Realmente Deus é o sentido e o objetivo, o centro de minha vida? Ele é o fim que dá forma e orientação a toda minha vida cotidiana? Tudo o que me foi dado para sustentar meu corpo e minha alma serve como fonte de sustento e estímulo para alcançar aquele fim?
Realmente Deus é o sentido e o objetivo, o centro de minha vida? Ele é o fim que dá forma e orientação a toda minha vida cotidiana? Tudo o que me foi dado para sustentar meu corpo e minha alma serve como fonte de sustento e estímulo para alcançar aquele fim?
Em sua oração, Vicente se refere a tudo isto chamando de “ingratidão e abuso”: “por não ter aproveitado como deveria das amorosíssimas Invenções de vosso Amor Infinito, e de vossa Misericórdia ao comunicar-me vossas graças, e pelo abuso que consenti deste Amor e Misericórdia Infinita...”
Assim, aproveito e utilizo os dons cotidianos e as experiências de minha vida para nutrir minha fé e minha confiança em Deus? Tiro vantagem, então, dos caminhos que me levam a uma fé mais madura; tiro vantagem das intuições e experiências, do alimento espiritual e dos bens materiais, dos talentos, de tantas capacidades, das relações e amizades, de minha família e comunidade e até das desilusões e perdas, das feridas e enfermidades...?
A palavra ‘fé’ não significa somente a aceitação daquilo que é verdadeiro. A fé modela e dá forma às nossas vidas: não permite que deixe à parte o ‘dom’ recebido, mas me leva a vivê-lo como uma chamada à confiança e ao aprofundamento de minha relação com Deus.
A palavra ‘fé’ não significa somente a aceitação daquilo que é verdadeiro. A fé modela e dá forma às nossas vidas: não permite que deixe à parte o ‘dom’ recebido, mas me leva a vivê-lo como uma chamada à confiança e ao aprofundamento de minha relação com Deus.
Diante de nós existe um caminho, um fim que é chegar até Deus, estar com Ele e viver em sua presença. Não é necessário e nem mesmo podemos pensar em realizar este caminho por conta nossa, sozinhos. Foram-nos e sempre serão dadas pessoas e coisas que nos ajudam e trazem vida a nosso percurso. Eles nos fazem sentir amados, guiados e acompanhados. Tudo isto, de uma forma ou de outra, é um convite e um desafio a ter confiança em Deus e a crer que Ele nos ama infinitamente.
A confiança que Vicente Pallotti tem em Deus é ilimitada. Mas Ele, mesmo reconhecendo o seu ‘abuso’ aos dons de Deus – como acontece quando fazemos um não correto uso destes dons – não chegou jamais a um ressentimento ou a um sentimento de auto-piedade. Antes, sempre confiou que Deus saberia ajudá-lo a colher bons frutos, como a certeza de que “quanto maior é a minha indignidade tanto maior será a Vossa benevolência que me concederá graças copiosas, e eficazes para aproveitar sempre de Vosso amor infinito e de Vossa infinita misericórdia...”
De seus escritos sabemos que Vicente era certo de que podemos sim aproveitar do amor e misericórdia, sinais da grande e primorosa atenção de Deus pelos homens: “Mas quem não sabe que se não se observa o preceito da caridade não se pode alcançar a vida eterna? Por isso, cada um... é forçado, constrangido a confessar que todos aqueles que vivem sobre esta terra devem procurar a salvação eterna de seu próximo eficazmente... pois recebemos de Deus todos os bens e devemos utilizá-los para Sua glória e para a salvação de nossa alma e da alma de nosso próximo...” (OOCC IV, 173-174).
Vicente Pallotti repetidamente rezava aos Anjos, vendo-os como nossos intercessores. Rezemos junto a ele: “Rainha dos Apóstolos, imaculada Maria, roga a teu Filho Jesus Cristo, Senhor da messe – para que mande operários à sua messe e perdoe a seu povo. E vos todos, Santos Anjos, Arcanjos, Tronos e Dominações, Principados e Potestades, Virtudes dos céus, Querubins e Serafins, Patriarcas e Profetas, santos Doutores da lei, Apóstolos, todos os Mártires de Cristo, santos Confessores, Virgens do Senhor, Eremitas e todos vos, Santos, rogai ao Senhor da messe – que mande os operários a sua messe e perdoe a seu ovo, para que possamos reinar com Ele para sempre. Amem.” (OOCC II, 378, As Orações a cura di A. Faller, p. 260-61).
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